1 – Educar na austeridade
As crianças precisam aprender a ser valentes, a ter coragem de ser austeras consigo próprias, senão o fracasso será rotundo, pois crescerão moles de ânimo e fracas de caráter e de vontade. A valentia necessária para viver a virtude da temperança deve ser proposta como um estilo de vida sóbrio, bom e desejável, que é a perfeição de si próprio. Comportar-se com sobriedade é um bem, é colocar ordem nos sentimentos e paixões quando estes se desorbitam e tornar-se dono de si próprio, é preparar-se para a vida.
“Tenham a coragem de educar na austeridade, senão não conseguirão nada”, dizia um educador a um grupo de famílias. Os filhos não entendem por que não podem fazer tudo o que gostam: navegar na internet por horas, passar o dia vendo desenhos ou jogando games, comer só o que apreciam, detestar encargos ou responsabilidades no lar… Para que façam também o que não é agradável, muitas respostas poderiam ser dadas a eles: – “Porque você tem outras obrigações a cumprir”, ou – “Para que você não seja caprichoso e faça também o que não gosta”. São respostas pobres que os filhos entendem apenas como negação ao que os atrai, sem revelar a beleza da virtude da temperança, que é afirmativa e capacita-os para serem donos de si próprios ao ordenar a sensibilidade, afetividade e instintos, e manter equilíbrio no uso dos bens.
Satisfazer as tendências naturais não é algo ruim, e faz parte da natureza humana. Mas é inegável que há um princípio interno de desordem em todos os seres humanos, o que afeta a ordem e o equilíbrio das tendências instintivas a ponto de que cada uma busque apenas o que a atrai, sem se preocupar com o bem de organismo: o instinto de se alimentar é bom, mas pode desajustar-se e conduzir à intemperança no comer e beber; a função procriativa pode conduzir à pornografia; o instinto de segurança quando se desorbita leva a pessoa a pânicos ou medos infundados. A função da temperança é proteger e orientar a ordem interior das pessoas.
2 – Aprender a dizer não a si mesmo
A frase “Acostuma-te a dizer que não” (Caminho, n. 5) revela uma atitude firme diante das ambições desordenadas dos sentimentos e paixões. É mais fácil dizer sim e deixar de lutar, mas isso é admitir a derrota sem se esforçar: a vitória e a paz vêm depois da luta ou da autoafirmação do eu consciente sobre nossos inconscientes desejos. Negar-se ao que é desordenado é afirmar a própria liberdade e não ser escravo de tendências cegas; dizer sim a tudo leva à despersonalização e torna a pessoa marionete de suas paixões. Para construir-se é necessário dizer não a algumas coisas é sim a outras, e isso indica que se possui uma escala de valores comprometidas com a verdade, e da qual não se abre mão.
“Temperança é espírito senhoril. Nem tudo que experimentamos no corpo e na alma deve ser deixado à rédea solta. Nem tudo o que se pode fazer se deve fazer. É mais cômodo deixar-se arrastar pelos impulsos que chamam de naturais; mas no fim deste caminho encontra-se a tristeza, o isolamento na miséria própria (Amigos de Deus, n. 95). O destemperado perde o controle de si na busca de fugazes sensações que sempre reclamam outras novas. Já o temperado ao dizer não às desordens instintivas educa suas sensações para respeitar a ordem das coisas, sem necessitar se empastelar ou fusionar-se nelas, mas mantendo a distância que convida à contemplação dos seres e não seu uso irracional.
3 – A temperança se vive desde a infância
Se desde pequena a criança é educada para controlar seus apetites, se aprende a apreciar menus variados e a comer também o que não aprecia tanto, se sabe aguardar a que todos se sirvam antes de começar a comer, se tem paciência para esperar e não desejar as coisas imediatamente, se cumpre seus pequenos encargos no lar, pode-se dizer que vivencia modos concretos de fortalecer a vontade, e se tornará um adolescente forte, sóbrio, longe de cair em adicções ou vícios que arrastam para o álcool, drogas e pornografia aqueles que possuem a vontade fraca.
A temperança deve ser ensinada aos filhos no ambiente familiar, primeiramente pelo exemplo de vida que adotam os pais: se são desprendidos e renunciam com alegria comodidades e caprichos (tal como comer fora de hora); se sacrificam-se para atender as crianças nas tarefas escolares, banhá-las ou dar comida aos menores; se “gastam” tempo para brincar com elas; se não jogam fora a comida que sobra, mas utilizam-na para completar outros pratos; se são laboriosos e não preguiçosos… Com tais exemplos, as crianças crescem considerando naturais tais modos de proceder, que passarão a vivê-los sem perceber. Além do exemplo de vida dos pais, e de modo que as crianças possam entender (elas captam as coisas melhor do que julgam os adultos), os pais darão explicações do porquê atuar de uma maneira e não de outra, relacionando o comportamento com o bem da própria pessoa, dos demais ou para oferecer um pequeno sacrifício a Jesus.
As circunstâncias para educar são diferentes em cada idade. Se a adolescência exige moderação nas relações sociais, mais do que na infância, será necessário dar maiores explicações sobre os motivos que levam a agir de um modo e não de outro. Quando a criança é pequena talvez não seja o caso de dar explicações complicadas para dizer que não irão a determinado local, para não coma fora de hora nem abrir a geladeira ao primeiro impulso de fome… Já na adolescência a explicação para viver a temperança no modo de descansar ou de comer com moderação dever ser sustentada por arrazoados que nutram a inteligência com argumentos que alavanquem a vontade para a pessoa autodominar-se.
4 – Respeitar a liberdade da criança
A educação capacita para tomar decisões livres e acertadas que vão configurando os valores a serem assumidos na vida. Mas, se na educação não há regras fixas, o importante é ajudar o educando e ter como nítidos os comportamentos que devem ser promovidos e quais os evitados. Isso deve ser conseguido longe de uma educação protetora que cerceie a autonomia das crianças, mal que ocorre quando os pais substituem os filhos em tudo o que eles poderiam fazer. Tampouco se educa com autoritarismos que não deixam espaço para o crescimento da personalidade e do critério próprio, porque se obedece por medo. Isso revela que os pais querem que seus filhos sejam uma caricatura deles, o que os despersonaliza.
Convém promover o princípio do respeito à liberdade! É preferível errar em algumas situações ao não impor o próprio juízo, principalmente se os filhos veem nisso algo pouco razoável e arbitrário. De acordo com cada idade, as crianças devem ir tomando as suas próprias decisões e assumir as consequências: – Quer ir ao parque ou ao shopping? Se escolheu ir ao parque, e lá chegando acha que está chato e pede para ir ao shopping, deve assumir a sua escolha e deixar o shopping para outro dia, a fim de aprender a pensar melhor; se quer ir à festa com o vestido verde, não insista para que vá com o azul: é melhor exigir em pontos mais importantes e não desgastar-se com picuinhas, que fazem perder a autoridade e tornam enfadonha a vida das crianças.
Dois exemplos sobre assumir as consequências de seus atos: certo garoto decidiu jogar contra a parede o prato da comida que não gostava, e seus pais deixaram a marca suja por vários dias para que a criança tivesse presente as consequências de sua ação, e com isso conjugaram o respeito à liberdade da criança com o não transigir com o erro dela. Outro casal, cansado dos caprichos do filho que só comia o que gostava, decidiu servir-lhe uma refeição convencional (arroz, feijão, carne e batata), que a criança não quis comer. Então, mantiveram o prato rejeitado nas refeições seguintes até que o pirralho, com fome de leão, comeu tudo, e vendo a determinação dos pais deixou de ser enjoado e cheio de frescura.
Por fim, os pais, com insistentes orações, não podem deixar de contar com a graça e a proteção de Deus para que seus filhos amem o bem e as virtudes, e se afastem do que é mau e desordenado.
Texto adaptado e acrescentado por Ari Esteves para o site www.ariesteves.com.br, com base no artigo “Educar na temperança e na sobriedade”, de J. De la Veja e J.M. Martín, no site www.opusdei.org/pt-br/. Imagem de Mikhail Nilov.